SISTEMA FINANCEIRO: INOVAÇÃO OU OBSOLECÊNCIA?
ARTIGO PUBLICADO NO ANUÁRIO BRASILEIRO DE BANCOS EM JUNHO/2019
Há um número incontável de empresas que um dia foram líderes de mercado, ignoraram e esnobaram inovações que estavam surgindo, entendam errado o mercado e foram atropeladas pelo mundo digital. Por vezes até continuaram existindo, mas sombras do que foram, muitas, quase zumbis, andando de lado ou para trás. A diferença entre empresas que crescem e as que desaparecem está exatamente na capacidade de se anteciparem ao que vai ocorrer, enxergarem novos rumos e serem inovadoras.
Na velocidade com que a tecnologia vai fazendo com que o futuro se aproxime do presente, o conceito de inovação necessita ser bem entendido. A inovação vê utilidade em invenções e as aplica, sustentando o crescimento econômico contemporâneo. Inovações tem a propriedade de criar novos mercados a partir de novos produtos e utilidades, ou seja, criam demanda. Ótimo exemplo? Smartphones.
Trilhões de dólares foram gerados a partir de tudo o que se desenvolveu em seu entorno, mas saiba: seu smartphone rapidamente estará obsoleto, e mais trilhões de dólares serão gerados.
Sistema bastante impactado pelas mudanças tecnológicas é sem dúvida o bancário, com suas operações correlatas ou derivadas. As mudanças em curso estão apenas em seu início e vão alterar estruturalmente todo o sistema.
A tecnologia está na base da operação bancária. Saliente-se que nos últimos vinte anos nosso sistema financeiro caminhou para próximo de uma cartelização quando, no início dos anos 2000 os atuais cinco grandes bancos brasileiros detinham aproximadamente 45% do crédito e dos depósitos e ao final de 2018 estes números chegaram a 75%. Embora complexa a explicação para esta concentração, os altos custos de investimentos em tecnologia ajudaram a concentrar o sistema, ao exigirem crescentes e continuados investimentos em hardware e softwares, que necessitavam ser repassados a seus custos, demandando escalas elevadas para retornarem. Os altos investimentos em TI foram sempre uma barreira de entrada para novos players no mercado bancário tradicional.
Aqui, a tecnologia mais uma vez representará fator desruptivo, pois as inovações criam novos modelos de negócios e permitirão a entrada de novos participantes no mercado, usando tecnologias e processos inovadores, alterando mercados e empresas e gerarão novos zumbis. O mercado de adquirência no Brasil, sempre linkado no sistema bancário, é um exemplo visível para todos, pois a ninguém escapa a chamada “guerra das maquininhas”, onde novos entrantes mudaram o mercado. Os efeitos da “guerra” são bem visíveis; as ações da Cielo, empresa líder, dados públicos, em janeiro de 2018 chegaram a valer R$ 26,20; em 24 de maio último fecharam a R$ 7,58, uma queda de 70% em pouco mais de um ano. A empresa foi mal administrada? Não. Novas tecnologias, estratégias comerciais, queda de barreiras tecnológicas e novos concorrentes, mudaram o mercado e as margens financeiras foram comprimidas.
Observando um pouco o que ocorre lá fora, se antevê que o mercado de adquirência no Brasil rapidamente poderá estar obsoleto na forma como opera, ou seja, através de uma rede física com os chamados POSs e seus equivalentes e que demandam investimentos e custos operacionais elevados. A próxima onda no Brasil será a utilização dos smartphones para a captura das transações com cartões, que baseada na Internet e não mais nas redes físicas de POSs, rapidamente vão ganhar espaço e abolir a emissão do cartão físico. Custos cadentes.
Olhando para a China, esta pulou a etapa das redes físicas de adquirência e passou quase direto para transações via Internet, onde a tecnologia já permite que seu cartão de crédito ou débito e sua senha, seja sua própria face, através de tecnologias de reconhecimento facial. O modelo chinês radicaliza na inovação, onde combina segurança e conveniência para seus usuários e torna obsoletos os atuais modelos de negócios. Atingir um mercado de quase um bilhão de pessoas, só com uso de tecnologias cada vez mais acessíveis e leves em termos de desenvolvimento e custos.
Voltando para o Brasil, o sistema bancário e a indústria de adquirência serão rapidamente impactados pelo movimento desruptivo mundial representado pelos Blockchains e pelas Fintechs, com suas capacidades de oferecerem inovações e de rapidamente agregarem valor, romperem barreiras e criarem novos mercados. A indústria bancária vai mudar significativamente nos próximos anos e se alterarão as condições concorrenciais atuais. Bancos realmente digitais, com o uso de inteligência artificial, com estruturas de custos leves e ágeis vão ganhar espaço, assim como um novo formato da adquirência, vão abrir oportunidades magníficas para empresas inovadoras.
Mesmo com a desastrosa situação econômica nacional dos últimos anos, a modernização tecnológica destes setores é inexorável e possui dinâmica própria, pois a escolha é inovar ou ser pego pela obsolescência.